500 ANOS DA
REFORMA PROTESTANTE
A VERDADEIRA DOUTRINA RESGATADA PELA REFORMA
PROTESTANTE
Teólogo e
Historiador Pr. Esdras Cabral de Melo
INTRODUÇÃO
É
difícil para mim como historiador, e talvez impossível, encontrar na história
do cristianismo, salvo o advento do Senhor Jesus Cristo, outro período de
grande repercussão histórica, como foi a Reforma Protestante. Nela o homem
respirava a liberdade e compreensão de quase tudo, principalmente sobre o
destino de sua alma, que até então era negociada pelas autoridades
institucionais da igreja dominante da época, a Igreja Românica. Claro que essa
liberdade conquistada, além da intrépida posição dos reformadores, vivia-se
nesse período do século XVI, o Século de Ouro do Renascimento, período mais
ilustre da história do mundo ocidental, onde: ‘‘o homem é a medida de todas as
coisas’’.
A Reforma Protestante tirou da
Igreja de Roma o poder de decidir sobre o comportamento e o destino da alma dos
fiéis. Mesmo com a reação da Contrarreforma, com os seus instrumentos de
perseguição e tortura, a Teologia Protestante não se intimidou e nem se
limitou, a esta resolução românica. Os avanços foram extraordinários, até as
regiões mais longínquas, foram alcançadas e surpreendidas pelos efeitos da
Reforma. A Europa já nos séculos XVII e XVIII, vivia os grandes movimentos
reformistas que não só ficaram nos países europeus, mas, migraram para outros
continentes como, América, África, Ásia e o novíssimo continente da Oceania.
Os Efeitos desse Reforma Protestante
são sentidos até os nossos dias, grande foi o impacto dessa reforma na vida e
nas instituições ao longo dos cinco séculos. A Reforma deu ao homem a dimensão
de encontrar-se com o ‘‘Deus redescoberto’’, sem precisar mais de
intermediários da cúria romana para lhe levar ao alcácer do Criador. O homem
agora liberto das mordaças dogmáticas e sacrifícios desnecessários, se mostra
atencioso à leitura, ao estudo e os verdadeiros ensinamentos das Sacrossantas
Escrituras. O maior legado da Reforma protestante pode-se resumir em Sola
Scriptura, Sola Gratia, Sola Fides, Sola Christus e Sola deo Gloria.
UMA
ÉPOCA PARA REFORMAS
Rogo-vos, irmãos, que noteis
bem aqueles que provocam divisões e escândalos, em desacordo com a doutrina que
aprendestes; afastai-vos deles.
1.
Conceito de Reforma
Muito
se tem ouvido falar sobre reforma e especialmente Reforma Protestante. porém
qual o verdadeira entendimento que se deve dar a esta terminologia? Vamos
explicitá-la usando mais duas terminologias para que são: forma e deforma, para
que o estudante da Bíblia ou de história do cristianismo possa compreender
melhor a alcunha da expressão ‘‘Reforma’’.
Reforma:
podemos dividir esta palavra em duas partes: ‘‘Ré’’ - olhar para atrás e
‘‘Forma’’ - como algo que tem corpo ou estruturação. Sendo assim a palavra
reforma, significa voltar novamente à forma. Só necessita de reforma algo que
perdeu a forma original ou seja, algo que ficou deformado. Por isso que diante
de um estado de deformação, houve uma extrema necessidade de se fazer uma reforma
com o escopo de buscar a forma, que se havia perdida ao longo de pelo menos dez
séculos.
Agora
vamos para o embasamento histórico sobre a necessidade de uma Reforma
Protestante. A igreja de Cristo nos seus primórdios, teve como fundamentação os
ensinamentos do seu fundador, o Mestre Jesus Cristo e as por sua vez as
doutrinas dos apóstolos que estão na sua maior parte no Novo Testamento.
A data de nascimento da Igreja de
Cristo teve início no dia da Festa de Pentecostes, cinquenta dias após a festa da
Páscoa.
Ao cumprir-se o dia de Pentecostes,
estavam todos reunidos no mesmo lugar; de repente, veio do céu um som, como de
um vento impetuoso, e encheu toda a casa onde estavam assentados. At. 2.1,2
Este é
o texto que fundamenta o nascimento da Igreja de Cristo com batismos e
conversão de almas. A igreja que nasce a partir deste texto Bíblico de Atos,
passa a ganhar sua forma como Igreja e corpo doutrinário no verso 42 confira:
E perseveravam na doutrina dos apóstolos e
na comunhão, no partir do pão e nas orações. Em cada alma havia temor; e muitos
prodígios e sinais eram feitos por intermédio dos apóstolos. Todos os que
creram estavam juntos e tinham tudo em comum. Vendiam as suas propriedades e
bens, distribuindo o produto entre todos, à medida que alguém tinha
necessidade. Diariamente perseveravam unânimes no templo, partiam pão de casa
em casa e tomavam as suas refeições com alegria e singeleza de coração,
louvando a Deus e contando com a simpatia de todo o povo. Enquanto isso,
acrescentava-lhes o Senhor, dia a dia, os que iam sendo salvos. Atos 2.42-47
E
perseveravam na doutrina dos apóstolos... A igreja na sua inauguração, já
começa com uma forma estrutural de corpo doutrinário a ser ensinado e praticado
por todos os fiéis daquela época, ou seja a Igreja toma forma baseado na
doutrina dos apóstolos, que são os ensinamentos de Jesus Cristo quando
estiveram com Ele aqui na Terra cerca de três anos e meio. Dessa forma a igreja
tem o seu alicerce, sua base para dar seguimento e difusão do genuíno do
evangelho de Cristo na Terra.
Mas
é o apóstolo Paulo, que através de suas cartas doutrinárias se torna o maior
teólogo da cristandade. Seus ensinamentos reverberaram por toda a história do
cristianismo, servindo de base para milhares de livros e ensinamentos que foram
e ainda são extraídos da forma original doutrinária em que ele escreveu para o
seu tempo e posteridade. É com o apóstolo Paulo que se encerra todo o corpo
doutrinário da primitiva igreja de Cristo.
Questões sobre a fé, salvação, único
mediador, céu e inferno, perdão, justificação, regeneração, santificação,
glorificação, eleição e predestinação dos Salvos, a Graça de Deus, Expiação
pelo Sangue de Cristo, doutrina do pecado,
doutrina geral da salvação etc. essas e outras doutrinas foram definidas
pelos apóstolos principalmente por Paulo em suas duas profundas cartas doutrinárias
Romanos e Efésios.
Esta forma doutrinária que ajudou a
igreja a ter uma identidade e que por sua vez fez dela um igreja crescente e
triunfante apesar das grandes perseguições do Império Romano, vem se mantendo
fiel a sua forma doutrinária até o final do Século III.
A deformação dos ensinamentos
doutrinários dos apóstolos começa por volta do Século IV, com a igreja perdendo
a sua forma. Por volta do ano 313, o Imperador Constantino torna o cristianismo
a religião oficial do Império Romano, após vencer uma batalha através de uma
visão de que Cristo dá a ele a vitória. Constantino junta Estado e Igreja.
Agora Constantino não só é o chefe de estado, mas também chefe da igreja. É
nesse período que a igreja começa a se deformar, a perder a forma. Começa a
introduzir na igreja o paganismo grego-romano, elementos de cultos que jamais
tinham sido permitidos pelos os apóstolos e pais da igreja.
O
século a seguir oficialmente surge o papado. As Igrejas eram livres, mas
começaram a perder autonomia com Inocêncio I, no ano 402 que, dizendo-se
“Governante das Igrejas de Deus exigia que todas as controvérsias fossem
levadas a ele.” Mas as questões teológicas deveriam ser resolvidas entre
teólogos e não decidida por uma pessoa. A forma antes estabelecida pelos
apóstolos cede a deformação de homens inescrupulosos. Leão I, ano 440, aumentou
sua autoridade; alguns historiadores viram nele o primeiro papa. Naqueles
tempos ninguém supunha que “ o Apóstolo Pedro foi papa”, fora casado e não teve
ambições temporais.
O poder dos pretensos papas cresceu
ainda mais quando o Imperador Romano Valentiniano III, ano 445, bajulado,
reconheceu oficialmente a pretensão do papa de exercer autoridade sobre as
Igrejas. O papado surgiu das ruínas do Império Romano desintegrado no ano 476,
herdando dele o autoritarismo e o latim como língua, embora o primeiro papa,
oficialmente falando, foi Gregório no ano 600 d.C.
A forma se manteve até o Século IV,
antes de Constantino. Porém, de Constantino até o Século XVI, ou seja, por mais
de 1000 anos a igreja esteve em colapso com a deformação, com as coisas
absurdas que passaram a surgir neste
período. A Bíblia já não era mais a única regra de fé, as encíclicas e bulas
papais tinha o mesmo ou mais valor do que a Escritura Sagrada. A salvação passa
ser o negócio mais rentável da igreja, a expiação pelo pecado só era concedida
pelo papa mediante a pagamentos. Criam-se a indulgência; o purgatório; os fiéis
eram lesados em sua ignorância, já que o conhecimento era restrito a apenas
monges e igrejas; missa em latim; oração pelos mortos; introdução da maldita
santa inquisição; mariolatria; a infalibilidade papal.
Todas essas heresias doutrinárias
originadas na igreja românica teve sua deposição com a graça, inteligência e
força dos reformadores. Era a hora de voltar às origens da igreja primitiva de
Cristo. O século XVI foi sem dúvida o mais importante período da História do
Cristianismo após Cristo e os apóstolos. Foi nesse século que culminou as
denúncias e a divisão definitiva da igreja.
A reforma traz a forma que havia se
perdido ao longo de XII Séculos. O acesso à verdade era imperativo, a leitura
Bíblica passa ser exigida dos fiéis para não serem enganados por doutrinas
heréticas, livre examinação das escrituras. A verdade agora está ao alcance de
todos. cumprindo-se o que diz as Escrituras. ‘‘e conhecereis a verdade, e a
verdade vos libertará. (Jo. 8.32).
A Reforma se encontrou com a forma e
destronou a deformação.
2.
Preliminares da reforma
O crescente desprestígio da Igreja Românica do Ocidente,
precisamente nos Séculos XIV e XV, no próprio enriquecimento material do que na
orientação espiritual dos fiéis; a progressiva secularização da vida social, imposta
pelo humanismo renascentista; a ignorância, o relaxamento moral do baixo clero,
a venda de cargos do alto clero, foram os fatores que desencadearam a Reforma e
a Contra-Reforma.
Não há como negar a influência da reforma em nosso
Século. Qualquer livro de história que aborde o tema: Idade Média e início da
Idade Moderna tem, obrigatoriamente, a necessidade de discorrer sobre um dos
principais marcos dessa época que veio a ser conhecido como “A Reforma
Protestante”, liderada por diversos reformadores e culminando decisivamente com
o monge agostiniano Martinho Lutero.
Antes de adentrarmos ao tema proposto, vamos acentuar as
razões que levaram as causas reformistas.
Os historiógrafos mostram que ao fim da Idade Média os
fundamentos do Velho Mundo estavam ruindo. Houve várias transformações nessa
época, mesmo antes, cuja importância não podem ser alienadas do pano de fundo
histórico da reforma. As mudanças foram cada vez mais acentuadas com as
descobertas de novos mundos por Colombo e Cabral .
A ideia de um estado universal foi cedendo lugar ao
conceito de nação-estado. Com a formação das cidades, a economia comercial
tomou lugar da feudal. Isso teve consequências sociais, pois o estilo de vida
das pessoas começou a ascender formando uma classe média forte - a burguesia.
Também no campo da cultura e da arte com o surgimento do Renascimento as
transformações intelectuais fizeram com que o protestantismo encontrasse apoio
para seu desenvolvimento. Urge rememorar que todas essas mudanças afetavam
direta ou indiretamente a Igreja Românica. Mas nenhuma delas talvez se fez
sentir mais do que as que ocorreram no campo religioso.
3.
Interpretação da reforma
É claro que as causas irão variar de acordo com
pressuposto histórico que o historiador aplicar na interpretação da Reforma.
Assim, temos várias correntes e escolas pelas quais os historiadores farão sua
análise crítica da Reforma: de maneira puramente racionalista secular, tais
como aquelas que só vêem as causas da Reforma nos fatores político-sociais;
outros no fator da economia; e outros ainda vêem a Reforma puramente como
produto do intelectualismo. Entretanto, uma cosmovisão puramente racionalista
tende a distorcer a definição e dar razões incompletas e deficientes à
verdadeira origem da reforma. Ora, se analisarmos o assunto somente sob a ótica
religiosa, ignorando a corroboração de todos esses fatores seculares e o
impacto que tiveram sobre o movimento reformista é tão errado quanto analisar a
reforma sem levar em conta a sua principal causa, qual seja, a religiosa.
Vejamos o que nos informa a respeito, o historiador Earle E. Cairns:
Historiadores Protestantes.
Interpretam a Reforma como um movimento religioso que procurou redescobrir a
pureza do cristianismo primitivo como descrito no Novo Testamento. Esta
interpretação tende a ignorar os fatores econômicos, políticos e intelectuais
que ajudaram a promover a Reforma.
Historiadores Católicos
Romanos. Interpretam a Reforma como uma heresia
inspirada por Martinho Lutero por causa de razões pessoais, entre elas a
vontade que tinha de se casar. O protestantismo é visto como um cisma herético
que destruiu a unidade teológica e eclesiástica da Igreja Medieval, se bem que
o catolicismo nunca conseguiu a proeza de se manter uno! Os historiadores
católicos se esquecem da problemática verdadeira envolvendo a Igreja Romana,
pois, no período da Idade Média, muitíssimas barbaridades e anomalias foram
geradas dentro da Igreja, o que causou muitos protestos que não foram atendidos.
Resultado final: a Reforma.
Historiadores Seculares.
Empenham mais atenção aos fatores secundários em sua ótica da Reforma. O filósofo
e historiador francês Voltaire ilustra muito bem a interpretação racionalista.
Para ele, a Reforma protestante foi apenas o resultado de uma briga de monges
da Saxônia e a Reforma religiosa, na Inglaterra, consequência de um caso de
amor de Henrique VIII.
É claro que tais conjeturas fazem parte da História. Mas
daí presumir de tão nobre movimento (pelo qual pessoas sacrificaram suas
próprias vidas) que somente esses motivos foram suficientes é falta de vontade
de analisar exegeticamente os fatos.
Historiadores Marxistas.
Determinam que a Reforma aconteceu por causa de questões econômicas. A Reforma
é vista como resultado da tentativa do papado romano de explorar economicamente
a Alemanha para lucro próprio. Seria o resultado da oposição de nações-estados
a uma Igreja internacional. Para eles, a Reforma foi um simples episódio político
de origem nacionalista. (CAIRNS, 1999).
Embora
haja elementos de verdade em todas as interpretações, será preciso notar que
suas ênfases, geralmente, recaem sobre causas secundárias e, quase sempre,
sobre uma causa secundária particular.
A Reforma não se explica de maneira tão simplória, pois
suas causas são múltiplas e complexas.
4.
Um Clamor por Reforma
Na verdade, a Reforma Protestante nada mais é do que o
cumprimento de um clamor por mudança religiosa, ainda que de maneira esporádica
através dos anos anteriores à própria origem da Reforma. Vejamos então:
Nas últimas décadas da Idade Média, a igreja ocidental
viveu um período de decadência que favoreceu o desenvolvimento do grande cisma
do Ocidente, registrado entre 1378 e 1417, e que teve entre suas principais
causas a transferência da sede papal para a cidade francesa de Avignon e a
eleição simultânea de dois e até de três pontífices. O surgimento do
"conciliarismo" - doutrina decorrente do cisma, que subordinava a
autoridade do papa à comunidade dos fiéis representada pelo concílio - bem como
o nepotismo e a imoralidade de alguns pontífices demonstraram a necessidade de
uma reforma radical no seio da igreja. Por outro lado, já haviam surgido no
interior da igreja movimentos reformistas que pregavam uma vida cristã mais
consentânea com o Evangelho. No Século XII,
movimentos reformistas surgiram em aberta oposição à hierarquia
eclesiástica, os valdenses, conhecidos como ‘‘os pobres de Lyon’’ ou ‘‘os pobres
de Cristo’’, questionaram a autoridade eclesiástica, o purgatório e as
indulgências.
Os cátaros ou albigenses defenderam nos Séculos XII e
XIII um ascetismo exacerbado, considerando a si mesmos os únicos puros e
perfeitos. Os Petrobrussianos rejeitavam a missa e defendiam o casamento dos
padres. No século XIV, na Inglaterra, John Wycliffe defendeu ideias que seriam
reconhecidas pelo movimento protestante, como a posse do mundo por Deus, a
secularização dos bens eclesiásticos, o fortalecimento do poder temporal do rei
como vigário de Cristo e a negação da presença corpórea de Cristo na
eucaristia. As ideias de Wycliffe exerceram influência sobre o reformador
tcheco John Huss e seus seguidores no território da Boêmia, os hussitas e os
taboritas, nos Séculos XIV e XV. Entre essas vozes protestantes estava também a
do monge dominicano Jerônimo Savanarola o qual, a mando do papa, foi preso,
torturado e enforcado. Nos capítulos a seguir falaremos mais detalhadamente
desses movimentos e personagens da Reforma Protestante.
Em posição intermediária entre a fidelidade e a crítica à
igreja romana situou-se Erasmo de Roterdam. Seu profundo humanismo,
conciliatório e radicalmente oposto à violência, embora não isento de
ambiguidade, levou-o a dar passos importantes em direção à Reforma, como a
tradução latina do Novo Testamento, afastando-se da versão oficial da Vulgata;
ou a sátira contra o papa Júlio II, de 1513.
Textos extraídos do livro: 500 Anos da Reforma Protestante - Causas Consequências e
Contribuições. Editora: Palavra de
Vida. Autor Esdras Cabral de Melo.
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